Bo Burnham’s Inside (2021)

Suíno Artístico
5 min readAug 20, 2021

--

Bo Burnham’s Inside é um especial de comédia de 2021 lançado pela Netflix. Ele dirigido, escrito e estrelado por Bo Bornham(Bo Burnham: Make Happy).

Bo Bornham é um músico e comediante que começou sua carreira fazendo canções no YouTube em 2006. Eventualmente seu sucesso o levou para o stand-up, tendo até iniciado uma carreira cinematográfica desde então, com filmes como Oitava Série e Bela Vingança. Seu estilo de comédia possui um tom extremamente sarcástico, comentando muito sobre a sociedade neoliberal que estamos vivendo e com piadas autocríticas no meio. Em abril de 2021, Bo anunciou no Twitter que, em Maio, lançaria um especial de comédia feito apenas por ele, localizado inteiramente em um quarto.

Eu tenho uma complicada relação com Stand-up. Há muitos especiais que estão no meu coração, como por exemplo Class Clown do George Carlin e Robin Williams Live 2002, mas a maioria deles acaba sendo muito típico, me deixando indiferente, ou irritado por usarem o famoso “ESTA GERAÇÃO ESTÁ MUITO SENSÍVEL E ME CANCELANDO. De qualquer forma, agora vou falar umas coisas racistas”. Sem contar no fato de ser muito fácil de comédias envelhecerem mal, fazendo com que seja difícil ver especiais de anos atrás. Mas um nome do meio que tem aparecido no meu radar e que tem me intrigado é Bo Burnham. Diferente de seus contemporâneos, ele é constantemente elogiado por fugir dessas armadilhas mencionadas e sua posição diante toda a situação moderna da máquina neoliberal capitalista que estamos vivendo. Junte isso ao fato de suas origens na internet e sua aparição maior em filmes, tive interesse em procurar mais de seus trabalhos. Então quando eu vi na Netflix o seu último especial, decidi dar uma chance ao garoto.

A primeira coisa que me pegou de surpresa foi toda a questão que 99% do especial era composto por músicas. Detalhe ao fato que não estava ciente que essa é a base de todos os seus trabalhos, então foi erro da minha parte. Porém, diferente da maioria das músicas de comédias, eu gostei bastante das canções contidas aqui. A produção é refinada, as composições são bem feitas e a voz dele possui uma personalidade marcante. Burnham brilha em sua habilidade como produtor, com boa parte das canções serem bem feitas e memoráveis. Mas talvez o que mais me chame atenção sejam as letras das músicas. Bo pega como o tema principal vários aspectos da nossa vida moderna, sempre apresentando elas com uma escrita absurdista. Ele fala sobre como o estado do capitalismo atual está nos destruindo como humanos, em canções como How the World Works e Unpaid Intern, a cultura “branca” e como ela apropria de lutas sociais, visto em White Woman’s Instagram e Problematic e, talvez o meu favorito, a modernidade líquida. Agora antes de você chegar com “credo esquerdomacho”, que também é um tema presente, o especial está falando no aspecto dos tempos de internet e como ela afeta nossa relação com a cultura, sendo melhor exemplo disso Welcome to the Internet. Por conta da quantidade de informação apresentada a nós em uma velocidade absurda na rede, é quase impossível algo ser realmente impactante, com trends e modas surgindo e indo embora assim como o relógio bate as horas. E dentro da mesma é apresentando todas as informações possíveis, independente de sua veracidade, que, junto a um algoritmo que apresenta exatamente o que você quer ver, pode facilmente colocar seus usuários em uma bolha, para o benefício de várias empresas atuais. A maneira como Bo passa isso, não só nas músicas, como em pequenas sketches que ocorrem durante o especial, é quase hipnotizadora de quão efetivo ele nos mostra essas absurdezes, nos levando a uma mistura de riso e choro.

Welcome to the Internet consegue passar sua mensagem com nuances de detalhes, um visual memorável e uma musica que não sai da cabeça.

Mas há também uma questão íntima e metalinguística aqui. Em vários momentos do especial, Bo tira um pouco do artificio cinematográfico e mostra ele próprio produzindo o especial em si. Suas expressões nessas partes geralmente são vagas, mas podem ser interpretado como um descontentamento, similar à angústia de um artista com a própria obra, nunca chegando ao perfeccionismo que ele deseja. É possível até mesmo deduzir em qual ordem que todas as partes do especial foram gravadas, apenas olhando a barba de Bo e seu cansaço. Ao mesmo tempo, ele enfia todas as suas inseguranças na tela. Burnham sempre possui um tom de autocrítica, principalmente ridicularizando o tom de comediantes que estão “melhorando o mundo” através de comédia. E, como é afirmado em uma sketch, ele já usa de defesa pessoal essa autocrítica para que as pessoas não façam ela, já que ele em teoria “já está ciente de tudo o que estão falando.”

O problema de Inside acaba sendo em sua duração. Uma hora e meia não é exatamente um tempo grande para um filme, porém um stand up típico que você encontra na Netflix tem apenas dois terços dessa duração, senão menos. Há um número constante de sketches jogadas em você, com algumas delas até mesmo sendo bem esquecíveis. O aspecto visual do filme é encantador, algo muito impressionante considerando que tudo foi feito por apenas uma pessoa, mas acaba exigindo que o espectador constantemente esteja prestando atenção a tudo que ocorre. Quando se junta todos esses fatores, acaba-se ficando exausto antes mesmo de chegar em alguns dos melhores momentos de toda obra. Isso não ocorreria em outros especiais, já que é seria possível tratá-lo apenas como um podcast, sem precisar da questão visual. Mas boa parte da experiência é perdida em Inside se for feito dessa maneira. O outro aspecto de crítica que tenho pode ser interpretado como “forçação de barra”, mas é algo que acredito ser relevante e isto seria como esse especial envelhecerá. Ele pega exatamente o feeling que estamos todos passando neste momento de quarentena, o que é aliviador e desesperador. Mas, se tudo der certo, este momento eventualmente passará. Mas será que esse especial continuará engraçado? Se daqui a dez anos, os temas dele ainda forem relevantes, ficarei preocupado da mesma forma.

Apesar de sua estrutura não ser apropriada à sua duração, Bo Burnham’s Inside é uma experiência única, que possui temas extremamente atuais com uma comédia sombria, sincera e bem executada.

Classificação 8/10

Semana que vem estarei fazendo Review do álbum Blackwaterpark do Opeth. Tem alguma recomendação de álbum ou filme? Solta aí nos comentários!

Oinc Oinc

-O Porco

--

--

Suíno Artístico
Suíno Artístico

Written by Suíno Artístico

Olá estranho. Neste canto infortúnio da internet, há um porco fazendo resenhas de obras artísticas. Se isso não te estranha, bem-vindo e boa sorte

No responses yet