Expensive $h!t — Fela Kuti & The Africa 70

Suíno Artístico
5 min readDec 10, 2021

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Expensive Shit é um álbum de Afrobeat do músico Fela Kuti e sua banda The Africa 70. Ele foi lançado em 1975 e distribuído pela Sounds Workshop Records e Editions Makossa Records.

Filho de uma ativista, Fela Kuti é um músico multi-instrumentista da Nigéria, que é conhecido por ser o pioneiro do Afrobeat, um gênero que constitui da mistura de highlife, jazz, salsa, calypso e músicas tradicionalmente iorubanas. Enquanto passava alguns meses nos Estados Unidos, ele entrou em contato com o movimento dos Panteras Negras, algo que influenciou bastante a política do grupo. Após voltar à Nigéria, ele fundou a República Kalakuta, uma comuna que se declarou independente do regime militar do país, fazendo com que Fela fosse perseguido pelo governo e deixando sua música marginalizada, tendo inclusive várias apresentações clandestinas que foram invadidas pela polícia local. Kalakuta foi destruída em 1978, mas não impediu que Fela continuasse uma carreira prolífera que durou até a sua morte em 1997.

Em nossas vidas, há aquelas músicas que, não importa quanto tempo passe, quanto tempo você ouça, você sempre irá gostar. No meu caso, uma delas é Zombie do Fela Kuti. Ironicamente, muitas de suas características se tornaram mais ou menos o que prolifera nos meus gostos atuais, especialmente o aspecto improvisional. Sendo sincero nem estou lembrado de onde exatamente conheci ela, eu só sabia que queria mais. É até vergonhoso que conhecia apenas algumas músicas ali e aqui dentro de um grupo de amigos que, aparentemente, sabia cabo a rabo do artista, e com vários dos meus músicos favoritos sendo altamente influenciados por ele (difícil não ser depois que ouvir). Então decidi pegar para escutar o álbum de mesmo nome da música que andou comigo quase minha vida inteira, e dizer que apaixonei por ele é pouco, fazendo com que eu me perguntasse como não tinha pegado antes para escutar. Decidi então partir para o próximo da lista, Expensive Shit.

Fela Kuti em todos as suas apresentações usa uma pintura branca, com o peito exposto e vários colares, criando uma imagem inesquecível e única.

Acho que a primeira característica que deve ser notada é a duração do álbum. É até difícil categorizar ele assim, já que é muito mais próximo de um EP, com apenas 24 minutos e duas músicas, a faixa-título de treze minutos e treze segundos, e Water Get No Enemy, onze minutos. Para os projeiros e deadheads de plantão, ouvir músicas desse tamanho pode ser só outra segunda-feira, mas não duvido que a maioria de vocês estão bastante intimidados, apesar de acreditar que não seja um caso de preocupação aqui. A obra traz uma experiência mais compacta e acessível para os novatos de jazz e/ou afrobeat, apesar de que acreditar que esta duração se dá mais por conta de uma questão financeira. Há uma entrevista com o John Dwyer, do grupo Osees, falando que gravar os dois lados de um disco é extremamente custoso, especialmente para bandas independentes, e acaba que isso deve ter acontecido com Fela, por conta de estar em um dos países mais pobres da África, a Nigéria. O primeiro álbum do grupo inclusive, foi gravado na Abbey Road, na Inglaterra, graças a uma amizade que Kuti tinha com o ex-baterista do grupo Cream, Ginger Baker.

Agora, a principal cola que mantém Expensive Shit, e de uma certa forma a carreira do Fela Kuti toda, junta é o aspecto percussivo de sua música, e isso é o que faz eu engajar com ela toda vez que a ouço. Como mencionado anteriormente, o afrobeat é uma mistura de vários estilos musicais, de maioria africanos. Por conta disso, não surpreende ela possuir essa característica, já que a maior parte dos estilos da região são focadas nela. Por conta disso, as canções do álbum possuem um gancho quase que imediato, e acho difícil não entrar no groove delas. Em geral ambas as faixas tem um foco maior na questão instrumental, apesar de Fela começar a cantar a partir de metade da música, algo que é bastante frequente. Mas, mesmo se você for desacostumado ao estilo, elas são bastante difíceis de entediar. As músicas possuem uma filosofia similar ao Krautrock, em que elas tem várias mudanças leves ao longo de sua execução. Isso faz com que o flow não seja perdido de momento a momento, e ela não acaba ficando chata. Isso poderia ser bastante enjoativo em álbum maior, mas como não é o caso aqui, você termina tendo um gostinho de quero mais.

No entanto, o que mais me deixa intrigado seja as letras das canções e o método em que elas são escritas. Fela era um militante contra o governo nigeriano, e por conta disso várias de suas músicas possuem um cunho político altíssimo. As faixas nesse álbum, por exemplo, são Expensive Shit, que fala sobre como o capitalismo faz com que seus produtos fiquem mais e mais caros, e Water Get No Enemy, que fala sobre como os líderes do mundo lidam com a questão hídrica. Mas você pensa que ele usa analogias ou fala figurativamente? Tu estás completamente enganado meu caro amigue. Traduzindo de maneira literal o refrão da música-título significa, “a última coisa que ele não quer é merda, por que? porque merda fede.” E toda essa tática quase crua de passar suas ideias está presente em toda em sua carreira, fazendo que tenha não só um caráter único mas também direto, com pouco espaço para interpretação errônea de suas ideias.

Expensive Shit pode ser estranho a quem está desacostumado à suas peculiaridades, mas se torna facilmente um álbum bastante envolvente, tanto em sua música quanto em sua política.

Classificação: 9/10

Músicas que mais gostei: Water Get No Enemy, Expensive Shit

Músicas que menos gostei: Só tem duas músicas parça

Semana que vem estarei fazendo uma resenha do filme Intriga Internacional de 1959. Tem alguma recomendação de álbum ou filme? Solta aí nos comentários!

Oinc Oinc
-O Porco

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Written by Suíno Artístico

Olá estranho. Neste canto infortúnio da internet, há um porco fazendo resenhas de obras artísticas. Se isso não te estranha, bem-vindo e boa sorte

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