Ben-Hur (1959)
Ben-Hur é um filme épico de ação de 1959, dirigido por William Wyler e escrito por Karl Tunberg, adaptando do livro Ben-Hur: Uma História dos Tempos de Cristo. Ele é estrelado por Charlton Heston (Os Dez Mandamentos) e Jack Hawkins (Mar Cruel).
Após ser acusado de um crime que não cometeu, Judeau Ben-Hur, um príncipe judeu, vai em busca de vingança depois de ter passado 3 anos de escravidão.
O cinema está morrendo! Ou pelo menos se diz isso desde que o cinema nasceu. Mas saiba que não me refiro à arte em si, e sim o local onde se compra ingressos, talvez uma pipoca, se coloca a bunda na cadeira e observa uma tela gigante te contar histórias fantásticas e irreais. Ou um lugar que você só perdeu dinheiro porque o longa era incrivelmente ruim. E esses espaços sempre lutaram para sobreviver contra, por exemplo, a televisão, o streaming e, até mesmo, uma pandemia mundial. Por conta disso, foi sempre usado uma “argumentação” para você ir a um deles. Às vezes eram artifícios toscos, com filmes mais toscos ainda, algo que falo a respeito na minha resenha do filme Matinee, outras vezes é a exclusividade de você ver uma nova estreia, e, o relevante para o assunto de hoje, o Road Show. Caso este termo lhe seja estranho, ele se refere à uma tendência do cinema norte-americano, que era criar filmes cujo orçamento e escala eram apenas menores que suas durações. Eles eram tão grandes que, assim como um teatro ou uma ópera, as exibições possuíam uma abertura musical, um curta de introdução e até mesmo um intervalo para se esticar a perna e comprar mais pipoca. Essa moda que dominou durante os anos 50 e começo dos 60 gerou alguns filmes como Cleópatra (1963), Amor, Sublime Amor (1961), Os Dez Mandamentos (1956) e Alô, Dolly (1969), que fez tão pouco dinheiro que acabou com esse método de distribuição, já que estava ficando cada vez menos rentável. Um dos maiores nomes do assunto é o filme Ben-Hur, que sempre ouvi falar, especialmente depois do remake desastroso de 2016, então decidi dar uma olhada nele.
Ben-Hur é um filme que, como gosto de dizer, dá para ver o dinheiro na tela. Todos os sets são extremamente gigantes, com centenas, talvez milhares de pessoas nos espaços abertos. Os espaço fechados, que em teoria provém um local menor e mais intimista, são provavelmente maiores que minha casa. Não só isso, todos os figurinos do filme são fantásticos. Não sou a pessoa a dizer se são historicamente realistas ou corretos, mas certamente são impressionantes, com algumas exceções ali e aqui, como as flechas que parece que são brinquedo. Sua trilha sonora é outra coisa cuja escala é inimaginável. Ela é extremamente bombástica, ampliando todos os sentimentos do longa em cem por cento, sendo inclusive algo que dá a base para as fantásticas batalhas e cenas de ação que ocorrem. Outra coisa que ajuda a dar essa impressão de tamanho é o tipo de rolo de filme usado. Caso tu veja Ben-Hur no HBO Max, verá que o aspecto dele é completamente incomum. Isso é porque ele foi feito para ser projetado em três telas gigantes que são curvadas, simulando um horizonte. Por conta disso, ele filmado em 65 mm, para mostrar toda o ambiente gigantesco, que nos é apresentado. Um filme mais recente que usou este artifício foi Os Oito Odiados (2015), que usou de sua execução esperada, com grandes ambientes ao ar livre sendo gravados, mas também subverteu isso ao utilizá-lo em um local fechando, dando a surrealidade de uma cabana pequena parecer gigante. Isso, no entanto, acaba que cria uma certa barreira impessoal ao longa. Close-up, um quadro que mostra apenas o rosto, é quase impossível, já que a gravação da câmera amplia ao extremo o campo de visão. Então, o roteiro vai ter que ganhar um peso a mais para trazer uma resposta emocional do espectador, já que a principal fonte emotiva, a face dos atores, está sendo prejudicada.
No entanto, o enredo é um aspecto que me deixa conflituoso. Por conta da escala e, do fato de estarmos tratando da velha Hollywood, os atores interpretam os personagens de maneira bombástica e exagerada, muito similar a um teatro. Certamente, se você é uma pessoa que presa pelo “realismo” de um longa, não é aqui que tu vai encontrar. Apesar de não gostar disso na maioria das vezes, é algo que surpreendentemente me prendeu. A relação entre Judeau Ben-Hur, interpretado por Charlton Heston, e Massala (Stephen Boyd) é algo que me remete muito à histórias mitológicas, com um embate dessas duas figuras gigantes. No entanto, assim como esses contos, acaba que também dá uma superficialidade ao filme. O protagonista está sempre moralmente certo, com algumas questões a serem tratadas no próximo parágrafo, e os romanos são seres horríveis e desumanos, usando inclusive simbologias nazifascistas em diversas cenas. Não que eu esteja querendo que eles sejam simpáticos, bem o contrário, mas uma certa humanização colocaria uma intriga muito maior entre o protagonista e os antagonistas, e nem é preciso ir tão longe para ver isso na prática. O personagem Ramsés II do filme Príncipe do Egito (1998) é posto em prova de seus ideais contra Moisés, o seu próprio irmão. Isso acaba gerando conflitos internos no protagonista, quanto no antagonista, que ao longo do filme, vai se afastando mais e mais de sua humanidade. Mas acho o que me deixa com mais sentimentos mistos é a duração do longa, 3 horas e 42 minutos. Em um lado temos o fato de que você sente que esteve em uma jornada junto do personagem principal, algo que poucos filmes conseguem passar de maneira positiva e/ou efetiva, mas, logicamente, o ritmo vai para o saco. Eu sinceramente senti que o longa continua muito mais depois que ele já deveria ter acabado, com minha humilde opinião que ele poderia ter sido cortado pela metade ou feito em uma mini-série, apesar que este último não teria um décimo do orçamento.
Mas o maior detrimento para Ben-Hur é a época em que foi feito e sua filosofia. Uma informação que escondi até agora, que os mais perspicazes ou cristãos de vocês já sabe, é que este filme não é só um épico qualquer, sendo mais especificamente um da categoria épico religioso. Este tipo de longa não era incomum na época, inclusive um dos mais rentáveis que tinha. Eu, com minha tradição de ver ou ouvir as coisas com o menor número de informação o possível, acabei descobrindo esta característica quando o filme começou, e não devo dizer que foi uma surpresa muito agradável. Não é nada muito criminoso, como Deus Não Está Morto (2014), cuja mensagem principal é “se for ateu, te atearei ao inferno”, mas ainda sinto que estão tentando me converter. Claro que, novamente, são incrivelmente bem produzidas as imagens religiosas, mas, falando especialmente a respeito do curta que introduz o filme, Um Conto do Cristo, estão sempre falando das mesmas histórias do maldito livro sagrado. A quantidade de vez que já vi recontarem o nascimento, a morte e o resto da vida de Jesus Cristo já deu para os próximos cem anos. Se tu precisa de realmente adaptar algo da Bíblia, tente outras histórias, que eu não duvido que tenha. Mas o pior é que a maneira em que é tratado essa questão seria algo que quase consideraria fanfic, já que o protagonista interage com JC por alguns segundos, e fica como parte do público, vendo de longe os acontecimentos importantes do livro. Inclusive a moral preta e branca vem dessa característica, já que muitas dos conflitos se tratam de um lado que tem Jesus no coração e outro que persegue os pobres cristãos, coitados. Mas não se preocupe que há também uma visão deturpada do islamismo. Sheik, o meu personagem favorito do longa, é facilmente o mais divertido, mas ele é um cercado de vários problemas. Um já de cara é o brown face que fazem no personagem. Caso não souber o que é isso, é quando pegam um ator branco e pintam seu rosto de uma tonalidade amarronzada para ele se passar por outra etnia, no caso aqui presente é alguém do oriente médio, ou como os anos 50 viam o pessoal da região. Tudo isso complementado complementado por um sotaque extremamente estereotipado, que certamente me deixou com um rosto desconfortável. Sua personalidade é muito solta e espontânea, mas muitas vezes acaba que é para mostrar como suas tradições religiosas e culturais são muito bobas, sem sentido ou arcaicas, sendo constantemente motivo de piada.
Ben-Hur é um produto do seu tempo de várias formas, tanto em produção quanto em tema, e acaba sendo mais historicamente interessante do que necessariamente um filme de qualidade.
Classificação: 6/10
A próxima resenha que estarei fazendo é sobre o álbum de estreia do grupo NehruvianDoom. Tem alguma recomendação de álbum ou filme? Solta aí nos comentários!
Oinc Oinc
-O Porco